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Hubs de data center e energia verde: a oportunidade criada pela MP 1.307/2025 nas ZPEs

A Medida Provisória nº 1.307, publicada em 21 de julho de 2025, altera a Lei nº 11.508/2007 e redefine o papel das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) na política econômica brasileira

 

Alexandre Jorge, Bianca Bez

Publicado no Canal Energia.

 

A norma cria um regime especial em que empresas autorizadas a operar nesses espaços passam a ter suspensa a exigibilidade de tributos como Imposto de Importação, IPI, PIS/Cofins internos, PIS/Cofins-Importação e AFRMM nas importações e aquisições internas de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos (novos ou usados), necessários às atividades da empresa e incorporados ao seu ativo imobilizado; e matérias-primas, produtos intermediários, materiais de embalagem utilizados integralmente no processo produtivo do produto final a ser exportado.

Essa suspensão será convertida em alíquota zero ou isenção, a depender do tributo, e terá vigência por 20 anos, prorrogável por igual período. Com isso, o Estado oferece previsibilidade regulatória e redução do custo de capital para atrair investimentos de grande escala.

Por outro lado, o benefício depende de contrapartidas específicas. Com a MP nº 1.307/2025, além de direcionar sua atuação ao mercado externo, a empresa interessada em se instalar em uma ZPE precisará consumir energia elétrica exclusivamente de fontes renováveis. O benefício fiscal assume a função de instrumento de política pública, voltado ao fomento da sustentabilidade e da transição energética no país, em linha com a defesa do meio ambiente, agora explicitada como um princípio constitucional tributário com Emenda Constitucional nº 132/2023 (art. 145, §­3º).

O governo troca arrecadação imediata por ganhos de longo prazo: geração de empregos, estímulo tecnológico, fortalecimento da cadeia de renováveis e ingresso de divisas pela exportação de bens e serviços. À luz da Análise Econômica do Direito, o Estado deixa de ser mero arrecadador para se tornar arquiteto de incentivos, reduzindo custos de transação e moldando comportamentos privados a favor de objetivos coletivos.

Um ponto central da MP é sua aplicação a setores de tecnologia intensiva. Ainda que não mencionados de forma expressa, os data centers estão incluídos no regime. A decisão é estratégica. O Brasil se insere na disputa global por investimentos digitais, posicionando ZPEs como potenciais hubs de processamento e armazenamento de dados. Essa inclusão não ocorre de forma neutra: ela impõe que esses empreendimentos estejam vinculados a usinas de energia renovável. A política pública cria, assim, um elo direto entre digitalização e transição energética. Sob a ótica coasiana (de Ronald Coase), ao reduzir a carga tributária e garantir estabilidade jurídica, o Estado eleva as chances de alocação eficiente dos recursos em um ambiente de cooperação.

É importante compreender o que são data centers e por que sua inclusão na MP tem peso tão significativo. Trata-se de complexos que concentram servidores, sistemas de armazenamento e redes de telecomunicação, funcionando como a infraestrutura invisível que sustenta a economia digital. Plataformas de e-commerce, bancos, serviços de saúde, redes sociais e aplicações de inteligência artificial só existem porque data centers processam e guardam dados em escala massiva. Sua operação, contudo, é intensiva em energia, o que explica a relevância da exigência de vinculação a fontes renováveis. Ao atrelar benefícios fiscais a esse modelo energético, a MP garante que a expansão digital ocorra em sintonia com a transição para uma economia de baixo carbono.

Para o Brasil, os data centers representam mais do que uma oportunidade de investimento estrangeiro. Eles podem reposicionar o país na geopolítica digital, reduzir dependências tecnológicas, estimular a instalação de cabos submarinos e atrair fornecedores de equipamentos e serviços correlatos. Além disso, podem criar polos de inovação em torno das ZPEs, fomentando startups, empresas de software e universidades em ecossistemas regionais. O impacto sobre a competitividade nacional pode ser profundo, já que a capacidade de hospedar e processar dados se converte em ativo estratégico em tempos de inteligência artificial e economia de rede.

Mas a MP também suscita riscos que precisam ser enfrentados. O primeiro é a captura regulatória: prorrogações sucessivas podem transformar um regime de exceção em subsídio permanente. O segundo é o impacto fiscal: em um cenário de déficit estrutural, a renúncia precisa ser compensada por externalidades efetivas. O terceiro é o problema da contrafactualidade: se parte desses investimentos já seria realizada sem incentivo, ainda que em menor escala, o benefício se tornará um subsídio redundante. Esses pontos reforçam a necessidade de avaliações posteriores que meçam, com dados concretos, os ganhos em emprego, exportação e redução de emissões.

A MP nº 1.307/2025 representa uma aposta na racionalidade econômica do incentivo fiscal condicionado. Seu êxito depende de transformar a renúncia tributária em investimento público com retorno social mensurável. Sem mecanismos de avaliação, o risco é repetir a história de incentivos fiscais improdutivos. Com controles adequados, o Brasil pode inaugurar um modelo mais sofisticado de política industrial, em que benefícios deixam de ser privilégio setorial e passam a ser instrumentos de eficiência econômica.

Alexandre Jorge , Bianca Bez , Data centers , Energia verde